Nas redes sociais, a funcionária pública, de 28 anos, foi chamada de irresponsável; chegaram a dizer que ela deveria ter morrido

RIO — A funcionária pública, de 28 anos, que foi a primeira pessoa diagnosticada com Covid-19 no Estado do Rio concluiu os 15 dias de quarentena nesta terça-feira. Liberada pelos médicos para sair de casa, a mulher, que mora na pequena cidade de Barra Mansa, no Sul Fluminense, foi a um restaurante com drive thru com o marido para comprar um sanduíche. Quando retornou, levou um susto ao ver as redes sociais.
— Um funcionário do restaurante avisou ao motorista que estava num carro logo atrás do meu que eu estava no restaurante. A pessoa gravou um áudio e postou nas redes sociais. A mensagem vinha com alerta de que eu, a pessoa com coronavírus, estava na rua. Eu me curei do coronavírus, mas estou sofrendo com o preconceito — disse a mulher que, mesmo com a liberação, está evitando sair.
A mulher relata que, enquanto estava em quarentena, sofreu ataques nas redes sociais. Ela pediu para que nem o seu nome nem o seu rosto fossem divulgados, mas na cidade onde mora todos sabem que ela contraiu a doença.

— Como é uma cidade pequena, todos se conhecem. Logo após o meu diagnóstico, os comentários nas redes sociais eram muito ruins. Alguns chegaram a dizer que eu deveria ter morrido. Me chamaram de irresponsável por eu ter trazido a doença. Entendo a preocupação das pessoas, mas não foi imprudência minha — frisou.
A servidora e o marido, um empresário da cidade, foram para a Europa no dia 10 de fevereiro. No roteiro inicial, a região da Lombardia, na Itália, que foi o epicentro da doença no país:
— Quando cheguei, não havia qualquer alerta sobre coronavírus e não sabíamos de casos da doença. Percorremos várias cidades, entre elas, Milão. No dia 16 de fevereiro, fomos de carro para a Alemanha, de carro.
O local romântico escolhido pelo casal foi uma cidade em Portugal. Ao chegar, ela começou a se sentir mal. Sintomas de uma sinusite, mas sem febre, e cansaço.
— Já tive sinusite duas vezes na vida. Percebi que eram os mesmos sintomas. Dor e peso na cabeça, cansaço e o rosto doendo. Como estava muito frio, e a viagem foi desgastante, achei que era um resfriado comum — descreveu.
‘Achei exagero, mas agora sei que era necessário’
Se sentiu mal em Portugal, e tomou um antiinflamatório.
— Voltamos para Milão. Já havia casos da doença, e passaram a ser mais rigorosos. Passamos por duas triagens e, apesar dos relatos, não enfrentamos problemas.
O casal retornou ao Brasil no dia 23 de fevereiro. A funcionária pública da prefeitura de Barra Mansa voltou à repartição e trabalhou normalmente durante dois dias. O cansaço e uma dor nas costas, no entanto, persistiam. Foi aconselhada a procurar um pneumologista.
Ela foi atendida na Santa Casa da cidade no dia 1º de março, onde foi submetida a exames de imagem dos seios da face e do pulmão. Relatou o roteiro da viagem à Europa.
— No mesmo momento, os médicos e enfermeiros colocaram máscaras e aventais. Todos os que precisavam ter contato comigo, usaram equipamentos de proteção. Aquilo me assustou um pouco. Achei exagero, mas agora entendo que era necessário — disse a mulher.
Todas as pessoas que tiveram contato com a servidora fizeram o teste de diagnóstico. Ninguém foi infectado:
— Mesmo com medo do preconceito, resolvi falar para deixar as pessoas mais tranquilas. Temos que cuidar para impedir a infecção daqueles que correm mais riscos, como os idosos, mas a doença nem sempre é fatal.
Fonte: O Globo.