Fernanda Torres contou sobre o trabalho na nova temporada e a intenção da série, que de acordo com Bruno Mazzeo, roteirista, voltou com um humor ainda mais ácido e provocativo. Falou sobre as falhas do nosso sistema presentes desde a época do descobrimento do Brasil e sobre outras Fernandas: a Montenegro, sua mãe, e a Young, sua grande amiga, que nos deixou esse ano. Você confere tudo isso nesse papo a seguir:
Uma série com tantas críticas sociais, que fala de preconceito, política… Ela poderia ter sido ambientada em qualquer época do Brasil, né?
As mazelas do Brasil são eternas, independente da época… “Filhos da Pátria” fala sobre isso, sobre as nossas mazelas eternas, um problema de raiz que está lá desde uma escravidão que não foi resolvida, de um patrimonialismo… de quem sempre teve no poder, de uma ideia extrativista: desde o primeiro português que veio cortar pau-brasil, ideia de um lugar que se plantando tudo dá e que tem que retirar a riqueza sem devolver nada. Então, “Filhos da Pátria” fala de das nossas mazelas de fundo.
Você vai do drama comédia com extrema facilidade. Qual dos dois é o mais difícil?
É difícil fazer texto ruim. Quando você tem texto ruim, tem que resolver o problema dele, criando uma emoção que não está ali, um humor que não está ali, quando o texto é bom, independe se ele é comédia ou drama. Porque o texto te leva. No caso dessa série tem momentos que é hilariante e de repente a cena fica terrível.
Em 92, No programa “Roda Viva”, você criticou o machismo e a cultura machista do nosso país. A forma como as mulheres eram tratadas. Vinte oito anos depois, acha que mudou alguma coisa?
Eu acho que sim. Hoje isso é um assunto novo que o movimento feminista colocou em pauta, acho que houve mudança, hoje é inaceitável certas piadas o comportamentos que há tempos atrás eram ditos como normais, banais… Hoje já se tem uma outra visão deles, nesse sentido acho que a última onda do movimento feminista foi bastante importante, bastante ativa e bem sucedido nesse sentido. Não havia essa contabilidade de que o Brasil é o quinto país que mais mata mulheres. Então acho que eu vi, sim, essa mudança.
Sua personagem é preconceituosa, racista… Afinal, lá no fundo, Maria Teresa tem um bom coração?
Maria Teresa essa contradição. É um monstro preconceituoso, machista racista. Ela é tudo para a família dela e ao mesmo tempo é uma dona de casa adorável, uma mulher cega, então isso que é o encanto dela, porque é como se ela fosse a sua tia, é uma pessoa que você ama porque é uma mãe gentil e por outro lado é um poço de preconceito. Então isso que é bom da série, essa contradição. É uma série que fala muito sobre o patriarcado brasileiro. Eu tenho um carinho pela Maria Teresa embora ela seja um monstro.
Em poucas palavras dona Fernanda Montenegro como mulher:
Mamãe é uma mulher incrível. Foi fazer teatro numa época impensável. Ela é uma menina do subúrbio, filha de operários, neta de imigrantes. Não sei porque que minha mãe um dia foi pra rádio fazer um teste de locutora. É muito interessante, se permitiu tudo no teatro. É uma de opiniões muito próprias, um ser livre.
Fernanda Young por Fernanda Torres.
Ela e o Alexandre, o que eles fizeram em “Os Normais”… A Fernanda, mais uma mulher livre! De pensamento próprio e livre. Uma mulher que tem um pensamento próprio livre e eles conseguiram imprimir isso em os normais com uma capa conservadora. Eram dois noivos, dois cordeiros, lobos em pele de cordeiro. Fernanda Young é uma mulher, que não tem… É um ser único, criativo, doida e ao mesmo tempo centrada… Mais um fruto de Niterói… Niterói produz seres muito interessantes.
Fonte: Hypness